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Especialistas alertam para os desafios da digitalização no sistema tributário
João GasparHoje às 10:18A digitalização da economia veio trazer diferentes desafios ao sistema tributário, de natureza sobretudo política, mas a máquina tributária portuguesa está bem adaptada aos novos tempos, afirmam especialistas em direito fiscal.”A digitalização da economia é um desenvolvimento económico que tem impactos enormíssimos em todas as áreas do sistema tributário, tanto ao nível legislativo, como ao nível da aplicação da lei e do controlo dos pagamentos”, afirma à agência Lusa a professora de direito fiscal na Universidade de Leeds, Rita de la Féria.Para a especialista, se na área dos impostos sobre o consumo o problema já não é tão grave como há seis ou sete anos, em que todas as vendas digitais “estavam a entrar num buraco negro”, nos impostos sobre o rendimento coletivo e individual ainda se está “muito mais no escuro”.As ideias em torno de um imposto digital, taxando os lucros das grandes empresas digitais, acabam por não resolver o problema e não lidar “com as questões de fundo”, defende.Em termos ideais, vinca Rita de la Féria, dever-se-ia considerar que quando alguém vai ao Facebook ou ao Twitter está a pagar pelo serviço com os seus próprios dados.”Podíamos dizer que há uma transação para efeitos de impostos sobre o consumo e dizer que a venda de dados conta como um pagamento não monetário”, explica.Ao mesmo tempo deveria, no seu entender, ser encetada uma segunda reforma – “muito mais difícil” – de âmbito internacional, para responder às mudanças que a digitalização trouxe, garantindo a tributação dos lucros no país onde o consumidor está.”Quando o sistema fiscal internacional foi instaurado, nos anos 20, os consumidores estavam no mesmo sítio que as lojas. Com a economia digital e a globalização o que vemos é que os consumidores não estão no mesmo país. Qual a legitimidade que os Estados Unidos têm de tributar o Facebook quando os lucros são feitos através de venda de dados de consumidores portugueses?”, questiona.”Se o Facebook tem clientes em Portugal, paga em Portugal, se tem clientes na Alemanha, paga na Alemanha”.O antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais Fernando Rocha Andrade considera que a digitalização “coloca ou agrava dois problemas que existem sempre num sistema tributário: deteção e aplicação”.Para o também professor universitário na Faculdade de Direito de Coimbra, a economia digital “caracteriza-se por uma enorme mobilidade”, baseando-se em “ativos incorpóreos, que não têm localização física”, sendo a localização das empresas “uma ficção jurídica”.Essa situação aumenta a facilidade de empresas multinacionais digitais “escolherem onde juridicamente se localizam sem que isso tenha algum reflexo verdadeiro no seu processo produtivo”, nota.Apesar de discordar de Rita de la Féria quanto à ideia de se assumir a cedência de dados dos utilizadores como um pagamento não monetário, Fernando Rocha Andrade também defende a necessidade de se tributar gigantes digitais como o Facebook ou a Google “na medida em que os consumidores de publicidade estão no país”, apesar dessas empresas poderem não ter qualquer presença jurídica no território nacional.Se por um lado a digitalização veio trazer diferentes desafios ao sistema tributário, os dois especialistas concordam que a máquina tributária portuguesa tem conseguido adaptar-se à mudança dos tempos.”A nossa autoridade tributária é tradicionalmente eficiente na utilização dos mecanismos digitais. Da mesma maneira que a digitalização contribui para facilitar a vida para quem faz evasão fiscal ou planeamento fiscal agressivo também do outro lado vai dando instrumentos novos”, nota Fernando Rocha Andrade.Para Rita de la Féria, a forma como a autoridade tributária portuguesa tem aproveitado o uso de tecnologias e ferramentas digitais “é um exemplo para o mundo”, depois de ter feito um grande avanço na sua digitalização desde o tempo da ‘troika’.”A digitalização cria desafios mas também há muitas oportunidades, principalmente no combate à fraude”, frisa a docente.A transição digital foi definida como uma das linhas de ação da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE), nomeadamente na vertente da transformação digital das empresas e das plataformas digitais.* Agência Lusa
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